Nota Pública: Júri Manoel Mattos - Um marco para os Direitos Humanos no Brasil

Nair Ávila, mãe do advogado assassinado - Foto: Site As Claras
As lágrimas e o sofrimento que vieram no dia 24 de janeiro de 2009, com o assassinato de Manoel Mattos, se converteram em combustível, como ele mesmo dizia. E é com ele que se chegou ao histórico dia da última quarta-feira, 15 de abril de 2015, com a responsabilização de um mandante do crime, o policial militar Flávio Inácio Pereira, e de um executor, José da Silva Martins, o José Parafina. Este, que foi o primeiro júri federalizado da história do país, despertando atenção nacional e internacionalmente, se torna um marco na defesa dos Direitos Humanos no Brasil.
 
A vitória, entretanto, ainda não foi completa, e há um longo caminho para percorrer até que todos os responsáveis por esse crime sejam responsabilizados e os inquéritos que apuram as execuções sumárias denunciadas por Manuel sejam finalizados e julgados.
 
Os desafios para se chegar ao dia de hoje iniciaram-se antes mesmo de 2009, com a morte anunciada de Manoel por denunciar a ação de grupos de extermínio na divisa da Paraíba com Pernambuco. Por seu trabalho em sua Itambé natal e em toda a região, desde 2002 ele era ameaçado. Para continuar na defesa dos Direitos Humanos, até mesmo o apoio da ONU e da OEA ele conseguiu, mas faltou a do Estado brasileiro. Sem escolta, sem defesa, ele foi assassinato covardemente.
 
Sua luta, porém, continuou por meio de sua família e de seus companheiros. E ela foi até onde nenhuma outra jamais foi. Previsto na Constituição, o Incidente de Deslocamento de Competência (IDC) – nome do mecanismo que garante a federalização de crimes que envolvam grave violação de direitos humanos, prevista na Constituição desde 2004 – foi obtido pela primeira vez no caso de Manoel Mattos, após ser negado na primeira tentativa, no caso da missionária Dorothy Stang. Depois dessa conquista no STJ, outros dois IDCs já foram concedidos.
 
Era a transferência da Justiça local para a Justiça Federal, na esperança de que isso garantisse mais segurança para a investigação e o julgamento. A força desses grupos de extermínio, entretanto, é tão grande que, na primeira tentativa de julgar o caso, na Paraíba, a sessão do júri não aconteceu por falta de jurados, que não compareceram por medo de condenar criminosos poderosos. O combustível dos que lutam por Justiça continuou a impulsionar o caso, obtendo uma nova vitória, o desaforamento de João Pessoa (PB) para Recife (PE), onde o júri se realizou na terça (14) e na quarta-feira (15).
 
Num júri que contou com grande interesse nacional, o Ministério Público Federal (MPF) e os assistentes de acusação conseguiram comprovar a participação dos dois réus. Flávio Inácio Pereira foi condenado a 26 anos e José Parafina, a 25. Ainda em plenário, a assistência requereu a transferência dos condenados para um presídio federal, o que não foi acatado de pronto pela juíza Carolina Malta. Sérgio Paulo da Silva, apontado como um dos executores, foi inocentado, sendo que a própria acusação entendeu que havia dúvidas sobre seu envolvimento com o crime. E, neste caso, também se manifestou pela absolvição.
 
Já Cláudio Roberto Borges, também acusado como mandante, e José Nilson Borges, acusado de ter emprestado a arma usada na execução, foram inocentados, mesmo com as acusações contra ele. O MPF, os assistentes de acusação e também a família de Mattos pretendem entrar com apelação contra esse resultado.
 
Com jornais, TVs e rádios de todo o país cobrindo o caso, a responsabilização de Flávio e José significa uma mensagem direta para esses grupos criminosos que se espalham por todo o país, mas também para o Estado brasileiro. As execuções sumárias não podem mais ser ignoradas. É preciso que o júri Manoel Mattos seja um ponto de ruptura dessa lógica de violência que atinge defensores de Direitos Humanos de norte a Sul. Eles não podem mais ficar expostos, sem proteção em suas lutas. Não podem ter o mesmo destino que Manoel Mattos.
 
Sua família – em especial sua mãe, Nair Ávila -, seus amigos e companheiros agora continuam seguindo na luta por Justiça. A responsabilização destes dois réus é uma sinalização de que não somente eles, mas toda a sociedade não tolera a ação de grupos de extermínio e reconhece o valor dos defensores de direitos humanos na garantia da democracia. Enquanto houver violações de Direitos Humanos e aqueles que lutam contra elas, o espírito de Manoel Mattos estará, sempre, PRESENTE!
 
Assinam:
  • Nair Ávila
  • Dignitatis - Assessoria Técnica Popular
  • Justiça Global
  • Terra de Direitos
  • Rede de Justiça Social e Direitos Humanos
  • JusDH
  • Rede Nacional de Advogadas\os Populares - Renap

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