Caso Dezinho: Um longo dia que percorre 19 anos


Por Viviane Brigida e Dioclécio Gomes
Rede de Comunicadores e Comunicadoras por Direitos Humanos no Pará

Na manhã desta terça-feira, 13 de agosto, no Auditório da 2ª Vara Criminal em Belém, o fazendeiro Décio José Barroso Nunes, conhecido como Delsão, volta pela segunda vez ao banco dos réus como acusado de mandar matar o sindicalista José Dutra da Costa, Dezinho, assassinado no dia 21 de novembro de 2000, na cidade de Rondon do Pará, sudeste do Estado.

Em 30 de abril de 2014, Delsão foi condenado a 12 anos de prisão no primeiro julgamento que ocorreu em Belém. Na época o Tribunal de Justiça do Pará (TJPA) anulou este julgamento, com isso o fazendeiro foi submetido à este novo Júri.

Conforme testemunhas, o pistoleiro Welligton de Jesus da Silva, acusado e condenado a 27 anos de prisão, teria chamado o sindicalista que estava em sua casa e ao sair para atendê-lo, foi alvejado com três disparos de arma de fogo. Dezinho foi assassinado na frente de sua esposa Maria Joel, hoje a principal testemunha do crime que vive sob proteção por também sofrer ameaças.
  
Em 2014, O pistoleiro Welligton de Jesus da Silva foi autorizado a passar um feriado de final de ano em casa e nunca mais retornou para cumprir a pena. 

Nesta sessão, a primeira testemunha a ser ouvida nesse novo julgamento do caso foi Walter Rezende Almeida, delegado que assumiu o inquérito no período e produziu um relatório sobre o caso. O promotor Franklim Lobato leu o relatório produzido pela testemunha, buscando trazer o fato através do documento produzido por Almeida.  Apesar de Walter afirmar não recordar o que escreveu no documento, em vários momentos, não negou as afirmações nele contidas.

A motivação que levou ao crime se deu devido Dezinho fornecer denúncia de terras griladas no município de Rondon do Pará, em que a fazenda Paraíso, de "Delsão" seria uma delas. Acrescentando o fato também de Delso Barroso ser denunciado por haver em sua fazenda ocorrência de trabalho análogo a escravidão. A vítima teria apontado existir cemitério clandestino nas terras do fazendeiro e denunciou ainda crimes ambientais. 

Delsão coleciona em torno de 500 denúncias de processos trabalhistas. possui cerca de 130 mil hectares de terra em Rondon, quase totalidade em terra pública federal e estadual. Responde a mais de 30 embargos do IBAMA por crimes ambientais praticados em suas fazendas. Responde ainda a mais de uma dezena de execuções fiscais na Justiça Federal de Marabá.

Durante os depoimentos nesta terça-feira no tribunal do Júri, alguns destes crimes foram novamente citados pelas testemunhas de acusação, além de enfatizar-se que Delsão era conhecido na região como “juiz”, aquele que sentenciava e determinava a execução de seus desafetos e opositores. A alcunha ainda se dava por Delsão ser membro de um consórcio de fazendeiros que controlariam "quem vive e quem morre" em Rondon do Pará.

Advogado Marco Apolo Santana  durante o Julgamento de Dezinho - Foto: Dioclécio Gomes
Os intermediários do crime Igoismar Mariano e Rogério Dias tiveram suas prisões decretadas, mas nunca houve interesse da polícia em prendê-los. Domínio de Souza Neto e Lourival de Souza Costa também foram acusados de envolvimentos no crime, julgados, foram absolvidos por insuficiência de provas.

Uma das testemunhas, Francisco Martins, levado a júri, afirmou em vários momentos a participação de Delsão como mandante da execução de Dezinho. Francisco relatou que  seu irmão Pedro, funcionário de Delso Barroso, havia cometido, a mando de Delsão, execuções de pessoas e asseverava informações de outras ordens de execução, inclusive, a de Dezinho. “Pedro tentou matar Dezinhho por duas vezes”, afirmou Francisco em testemunho.

O promotor de justiça Franklin Lobato Prado contou com assistência de acusação dos advogados Marco Apolo Santana e Antônio Alberto Pimentel, da Sociedade de Defesa de Direitos Humanos.
Durante o depoimento, Maria Joel, viúva de Dezinho, ficou bastante emocionada após relembrar os últimos momentos ao lado do marido. “Eu busco justiça e que os casos dos trabalhadores rurais não fique impune e nem do meu marido” dizia a sindicalista.

O advogado de defesa do fazendeiro, Antônio Maria Freitas Leite, durante o depoimento de Maria Joel tentou tumultuar a sessão com falas agressivas em tom alterado, dirigindo-se a testemunha com gritos: “A senhora é uma mentirosa!”, bravejava Freitas Leite. A sessão foi interrompida para acalmar os ânimos. 

O promotor  Flanklin  Lobato e os advogados de acusação expressaram indignação com o ocorrido. Marco Apolo Santana, assistente de acusação, assegurou que o advogado de defesa estava agindo: “de forma indireta de intimidar a testemunha, pois o advogado Freitas Leite quer desqualificar o depoimento e não será aceito”, apresentando ser o método de desqualificação uma estratégia da defesa.

Durante o Julgamento do Caso Dezinho, também estiveram no Fórum Criminal de Belém, representantes de entidades e movimentos sociais como Comissão Pastoral da Terra, Comitê Dorothy Stang, Central Única do Trabalhadores (CUT), Federação dos Trabalhadores Rurais Agricultores e Agricultoras Familiares do Estado do Pará  (Fetagri- PA) , Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), religiosos entre outros que acompanharam o julgamento e realizaram um ato ecumênico em frente ao Fórum para lembrar o sindicalista assassinado e os trabalhadores e trabalhadoras assassinados na luta por Reforma Agrária no Pará.   

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